terça-feira, 13 de outubro de 2009

Os Dois Irmãos e a Porta

Dois irmãos foram enviados numa jornada. Primeiro um depois o outro. Deveriam atravessar um vale, depois algumas montanhas e chegar a uma cidade. Aí carregariam as mulas de mercadorias e deveriam voltar.
Estavam ambos muito receosos porque, tirando a cidade, os outros locais eram inóspitos e cheios de perigos.
Saiu um dos irmãos, com as suas mulas e guias, uma semana depois saiu o outro. Passadas que foram umas semanas, o que saíra mais tarde regressou, as mulas ligeiras e as mãos vazias. Depois de um mês regressou então o primeiro, este com as mulas carregadas das mais ricas mercadorias.

O pai então juntou os dois filhos para que se explicassem. Começou com o que tinha saído mais tarde e regressado mais cedo e de mãos vazias:

"Eu atravessei o vale e o rio violento - começou - passei a ponte de corda, depois as montanhas e o frio do cume e cheguei à cidade muito cansado. Vi umas muralhas enormes e procurei pela porta. Encontrei-a mas estava fechada. Chamei uma vez, chamei outra. Como ninguém atendia sentei-me no chão toda a noite gritando para me abrirem a porta. Como ninguém apareceu comecei a pensar que talvez a cidade estivesse em guerra ou em quarentena por qualquer doença contagiosa. Em qualquer dos casos não seria seguro eu manter-me por ali e regressei a casa de madrugada."

Depois foi a vez do outro irmão:

"Eu também atravessei o vale e o rio pela ponte de corda, depois o frio da montanha e cheguei muito cansado às muralhas altíssimas da cidade. Procurei pela porta para entrar, entrei na cidade e não podia acreditar nos meus olhos: tanta riqueza e abundância como nunca tinha visto. Comprei e vendi várias vezes as mesmas mercadorias arrecadando um bom dinheiro e ainda trouxe as mulas carregadas para casa."

"- Mas - perguntou o outro irmão - e a porta? Não estava fechada?"
"- Ah! A porta! Estava fechada sim. mas eu rodei a maçaneta, empurrei-a com o ombro e entrei."


Rui Gabriel

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

O gatinho

O gatinho acordou um dia e estava sozinho. A mãe desaparecera, e a meia dúzia de irmãos também... talvez alguém os tenha apanhado e colocado num balde de água para os afogar, como é costume na vizinhança fazerem aos gatinhos nascidos de pais vadios, numa tentativa de acabar com a gataria na zona.
O problema é que ele estava cheio de frio e de fome. Começou a miar e a procurar a mãe por todo o lado mas não a encontrou. Foi procurar comida, guiado pelo olfato, mas as tampas dos contentores de lixo, que o seu pequeno tamanho não impediu de trepar, estavam bem fechadas e a refeição tornou-se impossível.
Chegou a noite. O vento foi vencido por um abrigo debaixo da escada de uma vivenda, mas o frio e atravessava a pelagem ainda fina e fazia doer os ossos. Não dormiu nada. A fome dava-lhe dores de barriga.
O dia seguinte passou-o na mesma busca. Nem mãe, nem comida. Instintivamente ele sabia que morreria se não encontrasse uma solução para a sua vida. Chegou a noite e a fome apertava mais que nunca.
Então reparou que por cima da escada onde tinha passado uma noite e se preparava para passar a segunda havia uma porta de vidro e de lá de dentro vinha um aroma delicioso, acompanhado de vozes de crianças a brincar e a rir. A esperança acendeu-lhe a alma e correu para a porta. Lá dentro uma família jantava e ria no quentinho de uma lareira acesa. 
O gatinho então desatou a miar com quanta força tinha. Sabia que se pudesse entrar ali estaria salvo. Miou, miou, miou. A certa altura a porta abriu-se e o pai daquela família gritou: "sai daqui vadio!". e deu-lhe um pontapé que o atirou para o outro lado da rua.
Aquilo doeu. Doeu tanto como dói a única oportunidade perdida de vez, por causa das acções ou opiniões de outros. O gatinho da história voltou para debaixo da escada e passou outra noite sem dormir e sem comer. Quando amanheceu estava muito fraquinho. O estômago doía-he muito e o frio não o deixava parar de tremer. Ele sabia que iria morrer em breve.
Quando chegou a noite de novo,  o desespero levou-o outra vez à porta de vidro. Lembrava-se bem do pontapé da véspera, mas a fome e o frio, e a visão da lareira e da mesa farta deram-lhe coragem. Colocou-se com o narizinho junto ao vidro, a olhar lá para dentro e desatou a miar, miar e miar. 
Passado um ou dois minutos a porta abriu-se e o pai gritou: "Outra vez aqui? Vai-te embora!" E atirou-lhe um pontapé ainda mais forte que o primeiro. O gatinho voou e caíu sobre uma pedras amontoadas do outro lado da estrada. 
Muito desanimado enrolou-se debaixo da escada e enquanto tremia de frio preparou-se para morrer. No dia seguinte o sol apareceu. O gatinho tinha adormecido e abriu os olhos. viu o sol e deslizou de debaixo da escada para se aquecer um pouco. Estava tão fraco que mal podia caminhar. Tentou ir em busca de comida, mas estava demasiado cansado. Sabia que não sobreviveria outra noite ao relento.

Quando chegou a noite, debaixo da escada, pensava nos meninos dentro de casa, no aroma da comida e no calor da lareira, e pensava em ir de novo miar ao pé da porta. Mas vinham-lhe de novo à memória os gritos do pai e os pontapés. "Deixa estar. Estás aqui bem.", decidia então.  A barriga já não lhe doía, e até o frio parecia coisa normal, estava anestesiado pela proximidade da morte e sentia-se confortável.

Então, do fundo dos seus instintos, veio-lhe uma energia inesperada, sem querer saber dos pontapés, ou das opiniões do pai ou de quem quer que fosse, e sem pensar sequer se teria sucesso ou não, arrastou-se escada acima e foi-se colocar mesmo em frente à porta a olhar lá para dentro enquanto as crianças brincavam. Só conseguia miar muito baixinho, mas com as garras conseguiu arranhar a porta. A cada miado e a cada arranhadela estava a preparar-se para o pontapé que ele sabia ser o último mas nunca desistiu. Então a porta abriu-se e uma menina gritou "olha que gatinho tão lindo!" Os irmãos vieram a correr e levaram-no para dentro.

O que o gatinho não sabia é que os pais tinham saído nessa noite para ir ao cinema e as crianças queriam tanto um gatinho que os pais já estavam cansados de os ouvir. Quando chegaram a casa não tiveram coragem de dizer não às crianças e hoje aquele gatinho é um grande gato.

Tudo porque decidiu lutar só mais um dia.


quinta-feira, 23 de outubro de 2008

5 mil euros... por 5 minutos.

Eu moro na Serra de Aire e Candeeiros e por aqui há muitas pedreiras. É realmente uma das principais indústrias da região a produção artesanal da famosa calçada portuguesa. Os artesãos são muito bem pagos, já que esta é uma arte difícil e antiga, e os clientes pagam muito bem porque a qualidade deste pavimento tem renome mundial em beleza, prestígio e qualidade.

Um dos principais empresários da região, um destes dias, tinha uma máquina avariada. É função desta máquina extraír da terra esventrada enormes blocos de calcário, branco ou azul escuro, consoante o caso. No caso presente deveria estar a fornecer 14 operários com os ditos blocos de pedra azul para eles a cortarem com o martelo quadrado em pequenos cubos de cerca de 5 cm de lado. O preço desta pedra cortada manualmente é muito superior ao do calcário branco, pelo que o empresáro estava muito preocupado com a avaria da máquina: parada dava um enorme prejuízo e iria sem dúvida nenhuma atrasar aquela encomenda para o Japão.

Veio o mecânico e montou, desmontou, tornou a montar, coçou a cabeça e disse: "não sei o que se passa, tenho de pedir ajuda ao meu chefe, para mandar cá um especialista da marca". 

O empresário soprou irritado, olhando para os 14 homens parados e para o cais de carga ainda vazio. "Então ele que venha já. O dia vai adiantado e se não resolvemos isto hoje, amanhã é mais um dia perdido". Sob a pressão dele o técnico da marca viajou mais de 50 km para chegar à pedreira ainda com luz do dia. Com ele vieram mais 3 mecânicos numa carrinha com muitas peças sobressalentes. Seria impossível que o problema ficasse por resolver. Chegou a noite, os 14 homens foram para casa sem terem feito nada, os mecânicos ligaram os projectores sobre a máquina e ficaram a trabalhar pela noite dentro.

No dia seguinte, quando os operários chegaram ainda a máquina estava parada, com 4 homens em volta, por cima e em baixo, a tentarem pô-la a funcionar devidamente. O patrão chegou e ficou muito zangado com a situação. Barafustou, falou do prejuízo de mais de 20 mil euros, da incompetência dos mecânicos. Por fim o técnico da marca que liderava as operações veio falar com o patrão.

"Olhe, passámos aqui toda a noite e não conseguimos resolver o problema. Fizémos tudo o que podíamos fazer. Acho que, nestas circunstâncias só nos resta desistir e chamar o Sr. Avelino". 

"E quem é esse Avelino?" Perguntou o patrão. O técnico respondeu: " é a pessoa que mais sabe destes sistemas electrónicos e hidráulicos. Se ele não souber... ninguém sabe." "Chame lá o homem então!" Ordenou o patrão.

Passadas que foram duas horas, o meio dia a proximar-se, os 14 homens parados, os mecânicos, o técnico e o patrão sentados em cima de umas pedras, chegou o Sr. Avelino num carro a cair de velho. Aproximou-se do grupo que se levantou de um pulo e perguntou o que se passava. O fato-macaco velho e uma maleta de ferramentas que mais parecia a mala surrada de um médico, chamaram a atenção do patrão que o cumprimentou desconfiado.

Sem dizer mais nada, foi até à máquina, desaparafusou uns parafusos, soltou uma tampa, pegou no martelo e deu três pancadas secas em alguma coisa. Fechou a tampa e mandou operar a máquina. Parecia milagre. Ficou a funcionar como nova e todos puderam voltar ao trabalho.

O patrão agradecido perguntou quanto era e o Sr Avelino respondeu: 5 mil euros, estendeu-lhe uma factura e dirigiu-se para a carripana velha onde tinha vindo.

"Espere, espere!" gritou o patrão. "por favor tome esta factura e envie uma outra detalhada, para ver se eu percebo como é que a conta é tão elevada! Você não esteve aqui nem 5 minutos e deu três marteladas!!"

O Sr Avelino respondeu: "Tudo bem aqui vai a descriminação: três marteladas: 1 Euro, saber onde e como bater: 4999 euros".



sexta-feira, 17 de outubro de 2008

A Cenoura o Ovo e o Café

Uma amiga minha, cujo pai é cozinheiro, sabe que eu gosto de avaliar as circunstâncias e aprender com todas as coisas. Vem muitas vezes ter comigo para conselho e uma das últimas, há cerca de um mês, veio queixar-se da vida que levava, como tudo era tão difícil. E tinha razão, parece haver pessoas com tudo facilitado a quem tudo de bom acontece sem esforço. Mas a ela acontecia o contrário. Mal tinha acabado de resolver um problema, aparecia outro ainda maior. Quando uma oportunidade surgia, logo algo tinha de acontecer para estragar tudo. Separou-se do marido num divórcio feio, estava a pontos de perder a casa para o banco porque não podia pagar o empréstimo, a filha mais velha não parava em casa e andava com companhias pouco recomendáveis, o patrão iria despedi-la em breve porque tinha arranjado uma máquina nova que poupava 25 postos de trabalho, tinham-lhe descoberto há menos um mês uma úlcera em risco de rebentar. Enfim, estava cansada de lutar contra as circunstâncias, mas tudo à volta conspirava para lhe atrapalhar a vida. 

Na altura, eu, estudioso da natureza humana, aconselhei-a a ter confiança e a não desistir, dei-lhe força e ânimo para continuar a lutar. A coisa funcionou... por alguns dias. Ela animou-se um pouco, mas por pouco tempo, rapidamente as sombras e o desânimo a consquistaram de novo.

Ontem veio falar comigo, completamente transformada. Mal a reconhecia, vinha muito arranjada, cabelo bonito, rosto maquilhado e um sorriso que começava nos olhos. Fiquei muito impressionado com a mudança e, por momentos pensei que ela tinha ganho a lotaria ou coisa parecida. Perguntei-lhe se os meus conselhos tinham finalmente dado resultado. A energia, a motivação e esperança que eu tinha transmitido finalmente pareciam surtir efeito.

Ela sorriu muito divertida e respondeu-me:
-"Nada disso. Obrigado pela ajuda, mas foi o meu pai o responsável pela minha mudança."
."O teu pai? O cozinheiro?"- Eu mal podia acreditar que uma pessoa simples, sem estudos e fechado numa cozinha de um restaurante de 2ª, pudesse ser o responsável por tão grande transformação.- "Como?"
- "Ele viu-me muito abatida com tudo o que me tem acontecido e chamou-me à cozinha. Sem dizer nada colocou três tachinhos com água ao lume e num pôs uma cenoura, noutro um ovo e no terceiro umas colheres de pó de café. Eu perguntava o que ele queria, mas ele não dizia nada a não ser que esperasse um pouco. Os minutos passavam e eu estava a ficar aborrecida a cirandar de um lado para o outro enquanto ele se envolvia nos seus afazeres e os tachinhos continuavam ao lume. Passados uns bons vinte minutos chamou-me, apagou os bicos do fogão e tirou a cenoura para um pratinho, depois fez o mesmo com o ovo e colocou um pouco do café numa chávena. Então perguntou-me: "que aconteceu aqui?" Como eu não sabia o que responder ele continuou: "nas mesmas circunstâncias, que é a água a ferver, a cenoura que era firme tornou-se mole e frágil, o ovo que era frágil, tornou-se rijo e forte mas o melhor de todos é o café: ele mudou a água." Entendi que tinha de mudar a minha forma de entender as coisas, não interessa lutar contra as circunstâncias, mas mudar essas circunstâncias mudando-me a mim. Eu era como uma cenoura, fiquei fraca e débil, tu ensinaste-me a lutar contra tudo e todos e deste-me força como o ovo, mas o meu pai ensinou-me que eu posso mudar as circunstâncias mudando de atitude."

Eu fiquei boquiaberto e muito impressionado. Aprendi essa lição. Amanhã vou à festa de anos dessa minha amiga. Despediu-se do emprego, assim o patrão já não a irá despedir e, com a ajuda de dois colegas da fábrica, anunciou a todos os fornecedores e clientes da empresa que se tinha despedido. Não tardou a ser contratada por um deles com aumento de salário e de regalias. Bateram-lhe no carro ontem mesmo, mas o seguro deu-lhe outro de substituição e pagará todas as despesas. O homem que lhe bateu no carro até é vizinho e nunca se tinham encontrado antes.


terça-feira, 7 de outubro de 2008

O Cão e o Prego

Havia um vendedor que costumava passar às quintas feiras numa determinada região e comia comida rápida à hora do almoço. Um dia encontrou um amigo de longa data que lhe recomendou um  restaurantezinho enfiado na serra onde serviam, às quintas feiras, um arrozinho de cabidela com galo caseiro que era uma especialidade. Ora o nosso amigo, assim que se encontrou de novo na região foi ao dito restaurante provar o referido galo caseiro. 

Logo ao entrar, notou, do lado de fora e relativamente afastado da porta, um cão a gemer e a ganir. Ainda pensou, assim de repente, que fosse um cão vadio qualquer, mas estava bem tratado e tinha ali a 3 metros uma bela casota de cão. Sem prestar muito mais atenção, o vendedor entrou e sentou-se num lugar perto da janela para apreciar a paisagem serrana. Mandou vir o galo e foi comendo umas azeitonas com pão caseiro enquanto esperava. Lá fora a vista estendia-se a muitos quilómetros e até alegrava a alma, mas o som agudo dos gemidos do cão começava a incomodá-lo. Ao olhar para ele, parecia de perfeita saúde, mas, ali deitado e a gemer, poderia muito bem estar doente. Um uivo mais agudo despertou-o dos pensamentos ao mesmo tempo que chegava o dono da casa com um tachinho de barro fumegante.

-"Ouça lá!", disse o vendedor, "Que se passa ali com o cão? Está doente?"
-"O cão? Nãaa, tá perfeitamente bem."
-"Então porque é que está a ganir e a uivar?"
-"É que tá deitado numa tábua velha que tem um prego, e o prego tá-o a aleijar."

O vendedor começou a rir, "olha que cão idiota", pensou. Depois perguntou:

-"Então, se o prego o está a magoar, porque é que ele não se vai embora?"
-"É que", respondeu o dono, "dói-lhe o suficiente para se queixar, mas não o suficiente para se mexer".

O vendedor agradeceu o galo, e enquanto o apreciava ia pensando com os seus botões "este cão é como certas pessoas que conheço... queixam-se, queixam-se, mas não fazem nada para saír de cima do prego".


segunda-feira, 6 de outubro de 2008

O Lenhador

Um jovem lenhador em busca de trabalho chegou a uma floresta onde estava um grande grupo de lenhadores e pediu para falar com o capataz. Depois de lhe indicarem onde encontrá-lo, ele lá foi, confiante e de machado de lâmina brilhante ao ombro, em direcção à barraca de tábuas que servia de cozinha, refeitório e dormitório para os 25 homens.

Encontrou um homem rude, de poucas palavras, que simplesmente resmungou quando o viu entrar. Por cima da cabeça dele havia um letreiro que dizia: "PRÉMIO DE 1000€ A QUEM BATER O RECORDE DE CORTAR ÁRVORES".

-"Eu sou o Serradura. Não terá por acaso aí um trabalho para mim?"
-"Mmm... não tens ar de muito forte. Darás conta do recado?"

O Serradura acusou o golpe e, olhando para o letreiro, perguntou: 

-"Qual é o recorde de cortar árvores aqui do estaleiro?"
-"Oito, mas o homem que o conseguiu é muito mais alto e forte que tu!"
-"Não faz mal. Dê-me o emprego e verá!"

O capataz olhou  de lado, mediu-o de alto a baixo e abanou a cabeça.

-"Arruma a tua tralha no último beliche ali ao fundo. Levantar às 6."

No dia seguinte, levantou-se como os outros, comeu uma bucha e foi cortar árvores. Parou para almoçar, trabalhou toda a tarde e à noitinha, ao chegar ao estaleiro os outros homens ouviram que ele ia tentar bater o recorde. Então juntaram-se todos à sua volta e o capataz perguntou-lhe:

-"Quantas árvores?"
-"Sete", disse cheio de confiança.

"Ficou perto" murmuraram os outros homens enquanto se preparavam para a janta. Eram ruidosos enquanto comiam, mas o Serradura comeu apressado e em silêncio, depois foi-se deitar.
No dia seguinte acordou mais cedo que os outros e trabalhou duramente toda a manhã. Parou para o almoço e trabalhou toda a tarde. Quando chegou ao estaleiro, ao mesmo tempo dos outros homens, estes voltaram a reunir-se em volta dele e o capataz perguntou:

-"Quantas?"
-"Seis", respondeu, desta vez um pouco triste.

Todos se dispersaram a abanar a cabeça e foram jantar. O Serradura comeu apressado, determinado em bater aquele recorde no dia seguinte, foi dormir e sonhar com árvores a caír e a receber os 1000€ de prémio.

No dia seguinte levantou-se mais cedo que ou outros, trabalhou a manhã toda, não parou para almoçar, trabalhou a tarde toda e chegou mais tarde que todos os outros. Ao chegar já estavam todos a jantar ruidosamente, a rir e a contar piadas. Quando o viram calaram-se todos e o capataz perguntou:

"-Quantas árvores cortaste?"
"-Cinco". Voltou as costas e foi-se embora com os pés a arrastar. Nunca mais foi visto por ali.

O que fez com que fracassasse um homem determinado, sem medo de trabalhar, motivado e competente? Muito simplesmente havia uma coisa que ele não sabia acerca do anterior recordista: depois do jantar, enquanto conversava com todos e ria em volta da fogueira, ia afiando o seu machado com o qual se poderia barbear pela manhã, de tão afiado.



terça-feira, 30 de setembro de 2008

O Frasco de Maionese

Um professor de filosofia iniciou a aula em silêncio, colocando alguns objectos em cima da secretária à sua frente. Como não dizia nada, os alunos começaram a mexer-se nas cadeiras, primeiro, depois a cochichar uns com os outros. Todos se calaram quando ele começou a encher um grande frasco de vidro com um determinado número de bolas de golfe, até ficar cheio.

Depois perguntou à turma: “O frasco está cheio?” e todos concordaram que sim, o frasco estava cheio, nem mais uma bola de golfe lá caberia. 

O professor então pegou num saquinho de seixos pequenos e despejou-o dentro do frasco. Os seixos rebolaram pelos espaços entre as bolas de golfe e assim o professor despejou o saquinho.

Em seguinda perguntou à turma: “O frasco está cheio?” e os alunos, agora mais atentos, responderam que sim, que agora estava cheio. 

Sem dizer uma palavra, pegou num saquinho com areia e começou a despejá-la dentro do frasco. À medida que os grãzinhos se infiltravam nos espaços livres deixados pelas bolas de golfe e pelos seixos, alguns alunos começavam a rir-se, divertidos, a ver onde aquilo iria chegar. Não poderia ir muito mais longe, afinal quantas mais coisas se poderiam enfiar naquele frasco de vidro? Quando terminou de despejar toda a areia, o professor perguntou de novo: “O frasco está cheio?” e todos concordaram que, antes realmente não estava, mas agora está, definitivamente cheio. 

Então o professor emitiu um sorriso rasgado e retirou duas chávenas de café de debaixo da secretária e começou a despejá-las para dentro do frasco. Os alunos começaram todos a rir, não só da esperteza do professor, mas também da própria ignorância, como se tivessem sido apanhados numa partida. O café escorreu das chávenas até à última gota, preenchendo os espaços deixados livres pela areia. 

“Agora”, disse o professor, “gostaria de comparar o frasco com a vossa vida. As bolas de golfe são as coisas mais importantes para vocês: A saúde, a família, o dinheiro, os amigos, as coisas que vos apaixonam. São as coisas que, mesmo que o resto desaparecesse, a vossa vida ainda assim seria completa.

Os seixos são as outras coisas de muita importância nas vossas vidas, como a casa, o carro ou o emprego.

A areia representa tudo o resto. As coisas pequenas, os pequenos caprichos, as preguiças de fim de semana, os passeios, a comida e a bebida, enfim, o que para cada um fôr pouco importante. 

Quem entendeu esta lição?”-alguns alunos levantaram a mão e, a um sinal do professor, um deles respondeu: 

“Isto significa que, se fizermos primeiro as coisas mais importantes, teremos tempo para fazer tudo o que precisamos.” 

“Muito bem”, atalhou o professor, “mas não só isso! O facto é que se colocares primeiro a areia no frasco, os seixos já não caberão. E se colocares primeiro os seixos, as bolas de golfe já não caberão. Ou seja, se gastares a maior parte do teu tempo e da tua energia com a areia, não podes esperar possuir também as bolas de golfe e, aos poucos, a tua vida deixa de fazer sentido. Presta atenção às coisas que são críticas para a tua felicidade e coloca-as à frente de tudo, em tempo e importância. Brinca com os teus filhos, dá um mimo à tua mãe, ou à tua esposa ou esposo conversa com o teu pai e o teu filho pequenino, toma conta de ti, do teu bem.estar e da tua saúde física, mental e financeira.” 

Um dos alunos então, levantou a mão e perguntou: “Então e as chávenas de café?”

O professor sorriu “ainda bem que há alguém atento na sala!” e respondeu:

“As chávenas de café são somente para mostrar que, por muito cheia que a tua vida possa parecer... há sempre tempo para um cafezinho e dois dedos de conversa com o teu melhor amigo”.


Rui Gabriel, http://ziglo.blogspot.com